por Mariângela Bairros

Professora FACED/Ufrgs

Domingo, 09 de setembro de 2018

Relatório do governo federal desloca sua responsabilidade para os estudantes

Por  Mariângela Bairros 

O MEC/INEP divulgou neste início de setembro os dados do IDEB, um conjunto de números que pretendem mostrar como vai a educação brasileira.  Neste anúncio o Governo Federal isenta-se de sua responsabilidade e passa o resultado insuficiente, segundo Governo, para estudantes e professores. Neste artigo pretendo trazer algumas questões que ficam por trás dos números, que não se evidenciaram.

Antes de anunciar os resultados do IDEB, no final de agosto, foram divulgados os dados referentes ao desempenho em português e matemática. O anúncio fez muito alarde e inicia dizendo que somente em 9 estados o desempenho dos estudantes em português e matemática cresceu. Chama-nos atenção algumas coisas que ficam por trás destes números: junto com MEC/INEP aparece citado nas matérias dos jornais que noticiaram os dados, quase que de forma imperceptível, a ONG Todos pela educação. Chama-nos atenção, pois os dados apresentados pelo INEP a partir do SAEB, dizem única e exclusivamente o quanto o Governo vai mal. Para além disso, qual a razão de citarmos uma ONG e não as Universidades públicas de todo o país onde desenvolvem-se pesquisas financiadas pela CAPES/CNPQ? Quem governa este país na atualidade pós golpe?

Seguindo com os dados, ainda que o Governo Federal apresente como fracasso da educação brasileira, os números gritam sobre o modelo de educação e da falta de investimento na educação pública. Os dados merecem atenção não pelos dados, mas pela gravidade de como o Governo Federal trata a educação brasileira. Merece destaque e atenção, pois pode passar desapercebido esta pontuação: no que diz respeito aos dados de desempenho do ensino fundamental, a etapa passou de 219 para 224 pontos. Em português passou de 208 pontos para 215 considerado como adequado, por quem e para quem? Nos anos finais do ensino fundamental, em matemática, a nota passou de 256 para 258. E, novamente, o adequado seria 300 pontos, quem decidiu isso, com quais critérios? Ouviram os estudantes, os professores? No ensino médio, os números dizem que o desempenho dos alunos passou de 267 para 270.  Em matemática a média foi de 259 e deveria ser de 350, segundo a classificação definida por uma ONG, onde não há pesquisa e estudos sérios na área de educação. Em termos de fracasso e sucesso educacional, o que nos diz esta pontuação?

 

Em relação especificamente ao ensino médio o relatório do SAEB afirma que: “a baixa qualidade, em média, do ensino médio brasileiro prejudica a formação dos estudantes para o mundo do trabalho e, consequentemente, atrasa o desenvolvimento do Brasil

Quem não estuda é o Governo Federal que ao fazer esta citação no relatório do SAEB, ao trazer os baixos índices do IDEB, esquece, por exemplo, de um excelente exemplo para se falar em desenvolvimento de um país, a Coréia do Sul. Há 50 anos atrás a Coréia do Sul era um país atrasado, inclusive no ranking global de desenvolvimento, ficava atrás do Brasil. O que mudou de lá para cá foi investimento em educação, fazendo que hoje este país seja responsável por uma indústria tecnológica de ponta, quase invencível, com indústria de celulares, automóveis, games, atração entre os jovens, sendo que a venda de jogos para celular chega na casa dos 700 milhões de dólares segundo a agência Korea Creative Content Agency.  Em relação a reforma do ensino médio os alunos nunca foram ouvidos, menos ainda os professores.

O MEC e o INEP, com essa afirmação do relatório do SAEB, deslocam sua responsabilidade para os estudantes. É mais ou menos assim, a febre é culpa do termômetro e não da doença em um corpo debilitado. Quem tem que oferecer alternativas, ações, propostas, políticas públicas educacionais, os estudantes ou o Governo Federal em apoio aos estaduais.

Junto com o anúncio destes dados que segundo Governo são insuficientes, porém ao anunciar estes dados alarmantes deveria anunciar, imediatamente, as medidas a serem adotadas para resolver aquilo que ele diz que está um caos, pois é isso que o Governo diz: o Brasil está um caos. Nisto nós concordamos. Está em curso no Brasil do pós golpe, uma ausência do Estado, pois hoje os responsáveis são os professores e alunos, não mais o governo.

Os índices do IDEB na educação básica foram aos seguintes: 5,8 para aos anos iniciais, superando a meta, nos anos finais 4,7 e no ensino médio atingiu 3,8 em 2017. A pergunta que não quer calar é: o que o IDEB não conta? O IDEB apresenta índices, mas não avalia como vão as escolas, a infraestrutura, a formação continuada para os professores, os salários e os investimentos educacionais. Nisto o INEP não tem interesse em divulgar e apresentar dados e índices.

Se vamos falar em desenvolvimento não podemos esquecer que o Governo Federal congelou os investimentos no Brasil por 20 anos, que país que deseja desenvolvimento faz isso? Cobra dos estudantes a baixa qualidade e que isso afetará, no futuro, o desenvolvimento social e econômico do Brasil, mas e o Governo Federal?

A verdadeira questão que está por trás dos números, é que o Governo não se implica junto com esses dados, coloca-se com total ausência em relação aos investimentos, por exemplo. Aprovou a EC 95 que congela por vinte exercícios financeiros, ou seja, por vinte anos os investimentos em educação, saúde e cultura. Áreas fundamentais para o desenvolvimento do Brasil não receberão aporte financeiro além do mínimo.

E para encerrar volto ao exemplo da Coreia do Sul, poucos lugares no mundo investem tanto em educação, tem 100% da população alfabetizada e foi o rigor na formação de professores e estudantes e o investimento educacional que trouxeram ao país o lugar que ela ocupa hoje, de uma potência mundial. Vamos falar em desenvolvimento social e econômico no Brasil? Vamos! Começamos então falando em investimento em primeiro lugar!

(*) Professora FACED/UFRGS

Professora da Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Integrante do Núcleo de Estudos de Política e Gestão da Educação. Doutora em Educação pela UFRGS. Mestre em Ciência Política pela UFRGS. Entre 2010 e 2015 professora na Faculdade de Educação (FAE) da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL). Editora da revista Cadernos de Educação (Qualis A2/Capes) entre 2013 e 2014. Diretora da Editora, Gráfica e Livraria da Universidade Federal de Pelotas no ano de 2014. Integrou o Grupo de Pesquisa, Currículo e Gestão de Políticas Educativas da FaE/UFPEL, desenvolvendo pesquisa sobre Políticas Públicas Educacionais na rede pública de Pelotas e Região. Membro do CONSUN – Conselho Universitário da UFPel e Representante do MEC junto ao Conselho Diretor – CONDIR em 2013 e 2014.

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