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Quarta-feira, 13 de maio de 2020

Pesquisa recomenda protocolo de ações para enfrentar efeitos psicológicos do isolamento social.

A ADUFRGS-Sindical vem divulgando as ações das Instituições Federais de Ensino da sua base para enfrentamento do coronavírus. Esta é mais uma dessas iniciativas: um grupo de pesquisadores do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas do Hospital de Clínicas - HCPA/UFRGS vem estudando uma outra pandemia relacionada à Covid-19: a do medo. 

No início do isolamento social no Brasil, quando os casos de coronavírus ainda não tinham chegado a números alarmantes, os pesquisadores do Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas do Hospital de Clínicas - HCPA/UFRGS, Felipe Ornell, Jacqueline Bohrer Schuch, Anne Orgler Sordi e Felix Henrique Paim Kessler, publicaram um editorial na Revista Brasileira de Psiquiatria que chamava a atenção para a questão. “Em uma pandemia, o medo aumenta os níveis de ansiedade e estresse em indivíduos saudáveis e intensifica os sintomas daqueles com transtornos psiquiátricos pré-existentes”, alertava o texto, referendando uma série de recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) a serem seguidas por governos e profissionais de saúde para enfrentamento do problema.

No artigo, os pesquisadores defendem que é urgente o aumento de investimentos públicos em saúde mental. “Nenhuma outra condição foi tão negligenciada quanto a saúde mental e nenhum país está investindo o suficiente nessa área”, explica Ornell. “No Brasil, temos um histórico de manicômios. A nossa reforma psiquiátrica data de 2001. Até então, a saúde mental era tratada como emergencial. E a carga da palavra loucura ainda é muito grande, há muita estigmatização e preconceito. Por isso, as pessoas não procuram ajuda”.

O grupo observou, logo no início da pandemia, que pessoas intelectualmente esclarecidas estavam vivendo o pânico do desconhecido. “Milhões de pessoas estão com suas rotinas afetadas e isso nos preocupa: os efeitos da pandemia além da questão biológica. Como é a resposta das pessoas ao medo? A gente evoluiu no nível da consciência, mas o medo ainda nos prepara para uma fuga de forma primitiva”, destaca Ornell.


A preocupação dos pesquisadores, que já estudaram os efeitos de outras epidemias na saúde mental, como Zika Vírus, H1N1 e Ebola, é com as implicações da COVID-19 em diversas esferas: organização familiar, fechamento de escolas, empresas e locais públicos, mudanças nas rotinas de trabalho, isolamento, levando a sentimentos de desamparo e abandono. Além disso, há a insegurança econômica. “Estamos viajando sem direção, porque nunca vivemos uma situação dessa proporção na história moderna. Ou seja, o medo da pandemia não é algo que conhecemos, mas os boletos chegando e o prazo de pagamento vencendo, isso sim, já sabemos que nos afeta”, enfatiza Ornell.

Assim, os riscos de indivíduos saudáveis desenvolverem transtornos como depressão, ansiedade, paranoia etc, é alto. E em quem já tem pré-disposição a essas doenças, a situação pode se agravar, segundo os pesquisadores. “Em alguns casos, a incerteza sobre infecção e morte ou sobre infectar familiares e amigos pode potencializar estados mentais disfóricos”, diz o artigo da Revista Brasileira de Psicologia.


Reprodução Facebook: Felipe Ornell

Há, ainda, outro fator que agrava o problema: o aumento do consumo de álcool. De acordo com uma pesquisa feita pela Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead), as vendas de bebidas alcóolicas nas distribuidoras cresceram 38% e nas lojas de conveniência o aumento chega a 27%, apesar da Organização Mundial da Saúde (OMS) ter recomendado a limitação da venda do produto. Segundo Ornell, embora o uso de drogas possa aumentar os riscos associados a uma infecção por coronavírus, os riscos sociais e psicológicos da pandemia podem favorecer e intensificar o abuso de drogas, em um ciclo potencialmente catastrófico.“No Rio Grande do Sul há mais de um milhão de alcoolistas e cerca de 500 mil pessoas com depressão. Esses números devem se agravar com a pandemia”, afirma.

Em meio a toda essa preocupação, porém, há o lado positivo: as pessoas estão começando a prestar mais atenção à saúde mental. “Nunca se olhou tanto para a saúde mental como agora. Isso ainda vai durar muito tempo e muitas pessoas serão afetadas, mas elas sabem que não são as únicas e que tudo bem estarem ansiosas, desde que isso não ultrapasse o limite da funcionalidade”, conclui Ornell.

Veja o protocolo completo recomendado pela OMS no final do artigo.