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Segunda-feira, 15 de junho de 2020

As eleições da UFRGS – Preservar a Universidade contra o autoritarismo

Nesta semana que passou ficou muito claro que a vontade do MEC e de Bolsonaro de intervir nas Universidades e Institutos Federais é real e iminente. Já que não passou a Medida Provisória 914/2019, que criava uma regra absurda de eleição, onde um amigo do poder podia se transformar em Reitor com apenas um voto, bastando estar na lista tríplice para ser nomeado, o governo baixou a MP979/2020, que simplesmente suspendia as eleições para Reitor, dando a Weintraub a prerrogativa de escolher o Reitor a seu bel prazer, acabando com a democracia e impondo sua vontade sobre a vontade da comunidade. Só a pressão das entidades e da sociedade sobre o Congresso fez o governo ser derrotado com a devolução da MP e sua revogação.

Mas não nos iludamos, a intervenção é o desejo deste governo, para impor na UFRGS e demais instituições a sua política. Bolsonaro despreza as demais instituições da República e acha que por ter sido eleito tem todo o poder, passando por cima das leis e da Constituição. O Ministro da Educação quer impor suas ideias obscurantistas e privatistas a qualquer custo, de preferência calando a voz das comunidades, dos sindicatos e das entidades representativas, querendo voltar a um passado que o Brasil parecia já ter deixado para trás, de autoritarismo e submissão das Universidades aos ditames de Brasília.

Mas a UFRGS e demais universidades federais não são órgãos do governo, são órgãos de Estado, que pertencem a toda a sociedade e, por isso, a Constituição em seu Art. 207 lhes deu Autonomia, em 1988.

Essa Autonomia, contudo, não é plena como defendemos, e a escolha dos reitores ainda passa por uma lista tríplice, que Bolsonaro insiste em não respeitar. O problema não é só ele não nomear o primeiro da lista, tradição que foi respeitada de 2001 a 2018 por três Presidentes da República, mas não nomear nenhum integrante da lista, desde que tenha o mínimo pretexto, como fez na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), onde há mais de ano uma pro-tempore sentou na cadeira de reitor e nunca mais saiu, com a desculpa de que as eleições estavam sob judice.

O risco na UFRGS

Por que a ADUFRGS entende que a UFRGS está sob grave risco de intervenção? Porque é a primeira grande universidade que vai ter o mandato do Reitor encerrado em breve (meados de setembro) e que tem um processo de eleição bem consolidado. Portanto, tem que seguir um estrito protocolo legal, pois há sempre a possibilidade de contestação por aqueles que não querem o reitor eleito pela comunidade, mas sim nomeado pelo poder.

Entenda como se dá a eleição na UFRGS

O ESTATUTO 

Em 1994, após o fim do regime autoritário a UFRGS, traumatizada pelo processo eleitoral de 1988 onde o terceiro colocado na lista sêxtupla (regra da época), elaborou novo estatuto, que, em seu Art. 12, inciso XVI, reza que compete ao CONSUN realizar a eleição do reitor, conforme a Lei, em processo que inclui consulta à comunidade (acesse o estatuto aqui). Essa foi uma garantia que a comunidade da UFRGS previu para evitar que no futuro nenhum CONSUN deixasse de consultar a comunidade, como acontecia na ditadura. Os associados da ADUFRGS já votaram em maioria defendendo que essa garantia permanecesse no Estatatuto, em 2011.
A Lei 9.192/1995 (veja o texto da lei aqui) mudou a regra da ditadura, isso no governo FHC, e perceba-se que esta Lei não foi mudada nos governos Lula, Dilma e Temer. Bolsonaro foi o primeiro a tentar mudá-la, com a MP914/2019, que caducou no Congresso sem apoio parlamentar. 

O que prevê essa Lei? Que o reitor seja nomeado pelo Presidente da República em lista tríplice elaborada no CONSUN, após votação uni-nominal e secreta dos conselheiros, em colégio que tenha 70% de docentes. E diz mais: se o CONSUN fizer uma consulta, como é o caso da determinação estatutária da UFRGS, essa consulta também terá o peso de 70% de docentes.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/1996 (veja o texto da LDB aqui) foi mais além, ainda no governo FHC, e no Art. 56 diz que em todos os casos, os órgãos colegiados e comissões, em instituições de ensino superior públicas terão 70% de assentos para os docentes. Foi por isso que a UFRGS teve que mudar a composição do CONSUN e, até hoje, tem 18 representantes docentes, para apenas nove de técnicos e estudantes. Essa lei, neste ponto, igualmente não foi mudada nos governos Lula, Dilma e Temer.

Vem daí então a preocupação da ADUFRGS com a presente eleição da UFRGS, cujo assento eleitoral será votado nesta terça-feira (16) pelo CONSUN.
Qualquer decisão que se tome, não respeitando o processo legal, que inclui a consulta organizada pelo CONSUN com peso de 70% de docentes e posterior elaboração da lista tríplice pelo CONSUN, certamente poderá ser usada por este governo autoritário como pretexto para nomear um pro-tempore que poderá ficar muito tempo no poder, sem respeitar as decisões democráticas da comunidade. 

Veja-se que há reitores nomeados por Bolsonaro que não convocam os conselhos e vão tomando decisões sozinhos. Esse é um grande risco que se abre para a UFRGS.

As posições da ADUFRGS

A ADUFRGS defende, junto com o PROIFES-Federação, que a autonomia universitária prevista no Art. 207 da Constituição seja regulamentada por uma Lei Orgânica das Universidades e Institutos Federais (veja a proposta do PROIFES aqui), para que se garanta que a autonomia de gestão, financeira e didática seja respeitada na Lei, coisa que hoje não ocorre.

Em relação à eleição de dirigentes, a posição da entidade é que não haja mais lista tríplice e que cada instituição eleja seu Reitor de forma autônoma e pelas regras decididas internamente.

A ADUFRGS não se furtará a participar ativamente deste processo como sempre fez, a exemplo de 2008 quando a entidade encabeçou um acordo entre os quatro candidatos para que a consulta fosse calculada com a proporção de 40:30:30, o que ocorreu.

Entretanto, neste momento histórico grave, a ADUFRGS, mantendo sua tradição democrática de mais de 40 anos, decidiu consultar os seus associados, para saber a posição real da maioria, e não ficar apenas emitindo a opinião de seus dirigentes. 

A consulta eletrônica, após a assembleia geral, foi realizada de 22 a 29 de novembro de 2019 e contou com a participação de 744 professores ativos, que por mais de 75% de votos decidiram que as regras da eleição da UFRGS não deviam ser mudadas.

A posição da entidade, que só pode ser mudada após outra consulta dessas, é a de que a UFRGS deve realizar a consulta na forma da Lei. E é importante deixar claro que não há mais prazo para muita coisa, pois como se esperou que a MP914/2019 perdesse o valor, o prazo para a eleição ficou muito exíguo, posto que até o dia 20/07 a lista tríplice deve ser enviada para o MEC.

A ADUFRGS exorta os conselheiros do CONSUN da UFRGS a terem muita responsabilidade nesse processo. 

Temos que preservar a legalidade da Universidade, pois será a única garantia de que possa continuar a existir enquanto Universidade autônoma, democrática e com ensino de qualidade. Preservando a consulta para a eleição para Reitor para que o eleito possa continuar a grande tarefa de uma Universidade para a Democracia.
 

Diretoria da ADUFRGS-Sindical