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Sexta-feira, 29 de março de 2019

“Mulheres e Universidade” é tema do Ciclo de Conferências Estudos Avançados em Ciências e Humanidades promovido pelo ILEA

Texto: Daiani Cerezer

As conquistas e os desafios das mulheres na universidade foram debatidos no primeiro painel do 13º Ciclo de Conferências Estudos Avançados em Ciências e Humanidades, promovido pelo Instituto Latino-Americano de Estudos Avançados (ILEA), na quinta-feira, dia 28.

Participaram da mesa, as docentes Luciana Mello (PPG Sociologia/UFRGS), Carolina Brito (Física/UFRGS), Natália Pietra Mendez (História/UFRGS) e Daniela Kern (IA/UFRGS), coordenação de Nádya Pesce da Silveira (Química/UFRGS).

Luciana Mello questionou a causa das desigualdades nas ciências e quais os mecanismos que dificultam a participação das mulheres em condições de igualdade. “A explicação está no modo como as relações de gênero se apresentam no cotidiano ou, dito em outras palavras, como as hierarquias de gênero operam”, explicou. “Em segundo lugar, está o conflito de maternidade e exigências da família versus a vida acadêmica. E, para finalizar, há um modelo masculino de carreira, que envolve compromissos de tempo integral para o trabalho, produtividade em pesquisa, relações academicamente competitivas e valorização de características masculinas.”

Carolina Brito citou inúmeros casos que expressam a falta de representatividade feminina de forma geral e falou sobre as possíveis causas desta desigualdade. Para ela, há desinteresse pela ciência e isso se comprova pelo desprezo ao conhecimento científico e à falta de reconhecimento social. Outra causa, na avaliação dela, é a relação das mulheres com a maternidade e família. “Conforme uma pesquisa realizada pelo IBGE, em 2018, as mulheres trabalham em média 10 horas a mais por semana que os homens”, ilustrou.

“A baixa representatividade de mulheres nas Engenharias e nas Ciências – sobretudo nos cursos de Física – é um problema cada vez mais reconhecido e representado por estatísticas. Na maioria dos países, cerca de 10% a 12% dos profissionais do campo da física são mulheres, um percentual que pouco se alterou nos últimos 100 anos. Tal situação atinge instituições de ensino no mundo todo e, em especial, as universidades. Embora as mulheres sejam a maioria das discentes, ainda são menos da metade das docentes”, afirmou. A percentagem de mulheres docentes lotadas nas universidades brasileiras mais proeminentes, na área de Física, oscila entre percentuais inferiores a 5%, como na UFES, e 25%, como na USP e na UFRGS, exemplificou.

Carolina também fez referência ao que chamou de “beliscões do dia-a-dia, que foram expressos nas campanhas ‘Esse é meu professor’ e ‘Esse é meu colega’, que retrataram a realidade vivida por meninas e mulheres nos seus cotidianos, em sala de aula, uma cultura machista que é convertida em frases e atos dos próprios professores. Através de um questionário online, foram coletadas mais de 150 frases de assédio e abuso ditas por professores da UFRGS”.

Por fim, reafirmou que “há pouca gente fazendo ciência no Brasil e muito pouca diversidade na ciência brasileira e mundial” e que “essa diversidade se reduz ao longo da carreira”. Desenvolver o Brasil implica mais gente fazendo ciência e tecnologia, e “esta gente”, segundo ela, “tem que ser diversa em termos de gênero, cor, localização geográfica etc.”.

Natália Pietra Méndez citou o livro “Explosão Feminista”, de Heloísa Buarque de Hollanda, uma das principais estudiosas que é referência na área de estudos feministas. Um dos artigos da obra, lançada no ano passado, traz um dado curioso: 73% da comunidade universitária no Brasil é formada por mulheres, considerando docentes, discentes e técnicos.

Ela explicou que “em 2016, apenas 1/3 das universidades brasileiras eram lideradas por mulheres, ou seja, mulheres nos cargos de reitoria, considerando que, na última década, houve uma expansão crescente das universidades brasileiras”. De acordo com outra pesquisa citada por Natália, a presença majoritária das mulheres nas universidades brasileiras é um fenômeno recente. Em 1956, elas representavam apenas 26% do total de matrículas e, em 1971, não eram mais do que 40%. “Então, ao longo do século XX, tivemos uma crescente participação das mulheres na esfera da universidade, porém desigual, principalmente quando consideramos fatores de gênero, raça, orientação sexual e outras”, pondera.

Para a professora da UFRGS, “este é um momento fundamental para que as universidades brasileiras se posicionem a favor da diversidade, da democracia, da liberdade e da autonomia e, principalmente, uma oportunidade para discutir formas efetivas de construir outra cultura institucional, que faça o enfrentamento às diferentes hierarquias que se reproduzem em nossos espaços. Além disso, é importante que a universidade seja um lugar de produção de conhecimento científico em diálogo com a sociedade, um conhecimento crítico, ético, comprometido com a defesa dos direitos humanos e orientado para o combate de todas as formas de desigualdades e de discriminações”, finalizou.

Daniela Kern apresentou o recorte de gênero nos acervos de Porto Alegre, bienais e exposições em museus, confirmando a baixa representatividade das mulheres. Para mudar essa realidade, ela falou sobre iniciativas que vêm sendo desenvolvidas, como a criação de um grupo no Facebook, chamado “Feminismo e História da Arte”, realização de seminários, oferta de disciplinas, grupos de estudos, debates e aumento de projetos de pesquisa sobre o tema na graduação e pós-graduação.