Apesar da maior diversidade, é a composição mais conservadora dos últimos 30 anos.
Eleito num pleito que teve como principal característica a negação do sistema político e suas práticas, confirmada pela rejeição dos políticos tradicionais, incluindo bons e ruins, o novo Congresso Nacional que resultou das urnas é um misto de renovação e continuidade. Renovado em 52% na Câmara e em 85% em relação às 54 vagas em disputa no Senado, é a composição de maior diversidade do Parlamento brasileiro. Conta com a presença de uma deputada indígena e com o aumento do número de mulheres, de negros, de LGBTs, de jovens, de parlamentares conectados às redes sociais, além do maior número de deputados e senadores em primeiro mandato e de maior escolaridade.
Apesar da maior diversidade, é a composição mais conservadora dos últimos 30 anos. O novo Congresso, com a presença de mais de 30 partidos, pode ser classificado como: a) liberal, do ponto de vista econômico; b) fiscalista, do ponto de vista da gestão; c) conservador, do ponto de vista dos valores; d) mais à direita, do ponto de vista político; e) mais refratários à proteção do meio ambiente; e f) mais atrasado em relação a direitos humanos.
Ideologicamente, no período pós-redemocratização, é o Congresso mais à direita do espectro político. Pelo menos 56% de sua composição pode ser classificada como de direita e de centro-direita (338 deputados e 35 senadores), 25% de centro-esquerda e esquerda (134 deputados e 17 senadores) e 105 de centro (76 deputados e 29 senadores).
O perfil socioeconômico também confirma a configuração liberal, do ponto de vista econômico, e conservador, do ponto de vista social. No caso da Câmara, 2/3 são profissionais liberais (200) e empresários (150), e os demais (160) são assalariados e ocupantes de profissões diversas. No Senado, são 40 empresários, quase metade, 25 profissionais liberais e 16 ocupam outras atividades assalariadas.
Pela composição e perfil do novo Congresso, a tendência é que a Câmara dos Deputados, onde se inicia a tramitação de propostas do Executivo, tenha a seguinte conformação em relação ao governo: a) apoio consistente de 256 deputados (PSL, PP, PR, DEM, PSD, PTB, PRB, Pode, PSC, PHS, PRP e DC); b) apoio condicionado de 117 deputados (MDB, PSDB, SD, PPS, Novo, Pros, Avante, Patri, PMN e PTC) e c) oposição de 140 (PT, PSB, PDT, PCdoB, PSol, Rede, PV e PPL).
Com tamanha diversidade, combinada com a inexperiência de pelo menos um terço das duas Casas, o novo Congresso pode “bater cabeça” nos primeiros meses da 56ª Legislatura, até entrar em seu ritmo normal, e as contradições ideológicas no interior da base do governo podem dificultar o consenso em torno de determinadas pautas, especialmente daquelas mais polêmicas e que envolvam mudanças culturais, como a agenda conservadora de algumas bancadas e do próprio partido do presidente da República.
O desafio do Congresso é enorme. Em primeiro lugar porque a maioria dos mais experientes e influentes, algo como 70 dos 150 parlamentares, estarão fora da próxima legislatura. Em segundo lugar porque a maioria dos novos parlamentares tem origem em religiões evangélicas, são policiais linha dura, são celebridades ou parentes de políticos tendo sido eleitos menos por seus méritos e mais por terem utilizado bem as redes sociais, se apresentando contra tudo que está aí. Em terceiro, poucos desses novos têm real noção do que são, o que fazem e como funcionam as instituições do Estado.
Entretanto, poucos governos encontraram um ambiente político tão favorável às mudanças estruturais, com a população consciente - ou doutrinada – sobre a necessidade de reformas liberais e fiscais. A intervenção na economia e o gasto perdulário, que inclusive levaram ao afastamento da ex-presidente Dilma, assim como a corrupção e a excessiva burocracia, são rechaçados pela sociedade e pelo mercado, tendo ampla ressonância no Parlamento.
A tendência, a julgar pelas condições favoráveis, que o Congresso se debruce sobre uma robusta agenda de reformas do governo, tanto nos campos liberal e fiscal, como a autorização para a venda de ativos (desestatização) e o corte de gasto público, quanto na área moralizadora, como a reforma do sistema político e suas práticas. A provação dessa agenda dependerá basicamente de duas variáveis: a) da capacidade de coordenação política do governo, e b) da calibragem em relação ao conteúdo das reformas.
O desempenho do novo Congresso, portanto, dependerá – e em grande medida – não apenas da pauta do Poder Executivo, cujo conteúdo coincide com o pensamento da maioria dos parlamentares, como também da capacidade de articulação e coordenação política do governo.
(*) Jornalista, analista político, diretor de documentação licenciado do Diap e sócio-diretor da Queiroz Assessoria em Relações Institucionais e Governamentais. Texto publicado na página de opinião do Correio Braziliense, edição de 1/2/2019.