Em plenária realizada via Facebook nesta quinta-feira, representantes de diversas entidades se manifestaram a respeito dos ataques sofridos pelos trabalhadores da Educação.
O Fórum Nacional Popular de Educação (FNPE) lançou nesta quinta-feira, 16 de julho, o Manifesto em Defesa da Democracia, da Educação Pública, da Ciência e da Tecnologia, durante plenária nacional transmitida pela página do FNPE no Facebook.
Assinado por quase 60 entidades, entre elas o PROIFES-Federação, o Manifesto trata sobre o direito à educação como uma construção histórica permeada pela interpenetração esfera pública e privada, as políticas de estado para a educação, e a reconstrução do país a partir da retomada do estado democrático de direitos e defesa da educação pública, como gestão pública, gratuita, democrática, laica, inclusiva e de qualidade social para todos e todas.
A mesa de lançamento do manifesto contou com a participação de representantes de algumas das entidades que integram a Coordenação Executiva do FNPE, além de parlamentares do campo progressista que atuam na defesa da educação pública e da regulamentação da educação privada.
Em nome do PROIFES e seus sindicatos filiados, o presidente, Nilton Brandão saudou a iniciativa e falou sobre a importância da união dos movimentos sociais. “Às vezes a gente se sente pequeno na luta, que é muito grande, e não enxerga resultado”, disse Brandão. “Mas o dia de hoje demonstrou a grande capilaridade que este Fórum tem. A representação de todas as cinco regiões do país mostra a união e forças e a compreensão de lutas comuns que nós desenvolvemos no dia a dia, dizendo que vamos ser vitoriosos, sim".
A plenária foi encerrada pelo relator do manifesto, o ex-conselheiro do Conselho Nacional de Educação (CNE), Luiz Dourado. “A expectativa é de que, com esse manifesto, nós possamos ter mais capilaridade e desdobramentos em uma articulação ainda mais efetiva com a sociedade civil e política na defesa da educação pública, gratuita, laica, democrática, de qualidade social para todos”, disse. “A educação é um campo de disputa e nós estamos aqui marcando uma posição. Viva a educação pública, viva o Fórum Nacional Popular de Educação!”, finalizou.
Leia o Manifesto na íntegra.
Mulheres na Educação
Mais cedo, na mesa Educação em tempo de pandemia e os profissionais da educação, a presidenta do PROIFES-Federação, Luciene Fernandes, falou sobre a desigualdade de gênero na Ciência. Segundo pesquisa recente, afirmou Luciene, durante a pandemia os homens estão publicando 3,7% mais artigos científicos do que as mulheres. Enquanto que a produção deles nesta área aumentou 6,4% desde março, a delas cresceu apenas 2,7%.
Os dados apresentados pela vice-presidente do PROIFES também indicam que os pesquisadores acadêmicos do sexo masculino são quatro vezes mais propensos a ter uma parceira que cuida da vida doméstica em tempo integral. Por outro lado, as pesquisadoras do sexo feminino são mais propensas a serem mães solteiras, a terem divisão desigual do trabalho e a assumir o cuidado com os filhos e dos pais. “Ou seja, para as mulheres, assumir as tarefas domésticas é algo que é posto. Para os homens, é uma escolha”, ressaltou.
Luciene pontuou o quanto a educação e a Ciência têm perdido com a cultura “androcêntrica”, tendo como base uma “sociedade patriarcal”, citando alguns casos como o da pesquisadora escocesa June Almeida, da Universidade de Londres, que descobriu o primeiro coronavírus humano, e da brasileira Jaqueline Góes, coordenadora do grupo de cientistas que sequenciou o genoma docoronavírus em 48 horas.
“A história tem nos mostrado, mesmo que às vezes invisibilizando muito a trajetória e a luta das mulheres, o quanto nós somos importantes na defesa da democraciae o quanto nós, principalmente mulheres negras, somos pouco representadas como estudantes e muito menos como professoras da universidade pública”, apontou Luciene.
“É preciso que a gente coloque esse aspecto na centralidade da nossa luta. Quando vencermos essas questões estruturantes para a construção da nossa sociedade é que poderemos avançar na direção de uma democracia que não seja tão instável e deficiente como a nossa e de uma educação pública que possa, de fato, trazer no seu bojo a formação de cidadãos com uma consciência libertadora”, concluiu.
Trabalhadores da Educação
O diretor de Educação da FASUBRA e presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Universidade Federal do Delta do Parnaíba, André Gonçalves, expôs o quanto os trabalhadores da Educação vem sofrendo com os ataques do governo federal, com o corte de salários, proibição de progressões e a redução do Estado brasileiro.
“Há um intenso desmonte da Educação e um ataque perverso ao servidor público”, afirmou. “E no meio desse turbilhão, nós, que trabalhamos direta ou indiretamente com a COVID sofremos com isso”, disse Gonçalves, citando o grande número de afastamentos do trabalho por conta do coronavírus porque “não há uma política de proteção a esses trabalhadores”.
O Dirigente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Zezinho Prado, enfatizou o baixo salário dos profissionais da educação. “O salário de muitos professores no Brasil é menor que um salário mínimo. Como ninguém pode ganhar menos que um salário mínimo, em muitos estados temos o que chamamos de ‘abono de chegada’”, esclareceu.
Durante a pandemia, as escolas na maioria dos estados estão abrindo mesmo com as aulas suspensas, apontou Zezinho. “Para chegar às escolas, muitos funcionários precisam pegar transporte público e, quando chegam, não recebem EPIs. O máximo que é oferecido são máscaras e álcool gel e sabão”, denunciou, lembrando que esses trabalhadores atendem pais e familiares dos alunos sem as mínimas condições sanitárias.
Educação de jovens e adultos
A ex-presidente da ANPED, professora da Universidade Federal do Goiás e militante do Fórum Goiano de Educação de Jovens e Adultos (EJA), Margarida Machado, também destacou os retrocessos nas políticas sociais desde 2016, e falou sobre os desafios da educação de jovens e adultos no país. Sobre os profissionais da EJA, Margarida disse que “nós temos uma enorme invisibilidade dentro dos sistemas educacionais, embora o Brasil ainda tenha mais de 11 milhões de brasileiros com mais de 15 anos que não são alfabetizados”, enfatizando que mais de 52% da população com mais de 25 anos ainda não concluiu a Educação Básica.
“Nós enxergamos esses alunos como trabalhadores que estudam e que precisam encontrar na EJA uma perspectiva de educação emancipatória que encare o mundo do trabalho como o principal desafio a ser enfrentado no currículo construído com os trabalhadores e não com o discurso de empreendedorismo, de competências, que nós vivenciamos nesses últimos anos com a implantação da Base Nacional Comum Curricular”, opinou a professora Margarida.
Acesso e acessibilidade
Professor do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Leonardo Cabral, falou sobre acessibilidade na educação durante a pandemia, não se limitando aos casos de pessoas com deficiência física. “O contexto tem a ver com a comunicação, com o acesso à informação, à tecnologia, à profissionais com formação específica. Então, hoje, a gente tem que compreender que as pessoas com deficiência podem ser indígenas, podem ser do grupo LGBTQI+, quilombolas, pretos e pardos, da fronteira...”, destacou.
Cabral também apontou que há diferentes realidades em um país com dimensões continentais como o Brasil e que isso deve ser considerado, portanto as questões que envolvem o acesso à educação são diversas e variam de estado para estado e de região para região. Ele citou como exemplo as “escolas das águas” do Pará, que precisam responder não somente a aspectos educacionais, mas sociais e econômicos.
Para encerrar a mesa, o pesquisador do Instituto Federal do Rio Grande do NorteDante Moura, da AMPED, pontuou que “o contexto da pandemia nos expõe de forma muito radical o caráter destrutivo do modo de produção capitalista”, pontuou, exemplificando com a elevação dos preços dos insumos para combate à pandemia e os prováveis processos de corrupção na aquisição dos equipamentos.
Moura disse, ainda, que a imposição ao professor da educação à distância, sem que ele tenha conhecimento das ferramentas, “opera na desqualificação do docente” e que a situação está sendo imposta aos professores, sem direito a questionamentos. “Nós não podemos nos conformar a essa situação, enquanto trabalhadores do campo da educação”.
Divulgação
O Manifesto em Defesa da Democracia, da Educação Pública, da Ciência e da Tecnologia será amplamente divulgado e poderá se tornar, segundo o professor Luiz Dourado, uma petição pública. A vice-presidenta da Internacional de Educação para a América Latina, Fátima Silva, informou que o documento será traduzido e divulgado para todas as entidades filiadas à IEAL, fortalecendo os laços latino-americanos.