Atividade teve a participação de entidades da sociedade civil, MPF e docentes.
Texto Giliane Greff
Fotos: Manoela Frade/Araldo Neto
O tema da liberdade para ensinar e aprender encerrou o Seminário Presente e Futuro das Universidades e Institutos Federais, promovido pelo PROIFES-Federação e a ADUFRGS-Sindical. Docentes do Rio Grande do Sul e de Goiás e representantes da sociedade civil e do Ministério Público Federal participaram da última mesa de debates, na tarde deste sábado, dia 1 de junho.
A presidente da Associação Mães&Pais pela Democracia, Aline Kerber, falou sobre a criação da entidade, que começou a ser articulada logo após o segundo turno das eleições do ano passado. Com 5 mil inscritos e atuação em 60 escolas públicas e privadas, a Associação promove cafés democráticos, com debates sobre temas como liberdade de expressão e pluralidade de ideias.
“O que mais buscamos, nesse momento, é dialogar com professores, para intermediar questões relacionadas ao cerceamento da liberdade e imprensa", explicou. Aline citou, como exemplo, dados de uma pesquisa realizada com professores durante as manifestações ocorridas no 15M pela Educação, em que 58% declararam que houve cerceamento da liberdade a partir do projeto Escola sem Partido.
“A sala de aula é um espaço privilegiado para formação da cidadania, de valores plurais, contra toda forma de preconceito e nossos filhos não estão em negociação", finalizou.
Russel Dutra da Rosa, professora da Faced/ UFRGS e coordenadora da Frente Gaúcha Escola sem Mordaça, destacou a importância dos temas debatidos no Seminário para o momento em que o país está vivendo. Ela lembrou que o Artigo 6 da Constituição prevê a educação como um direito social e relatou como surgiu o movimento Escola sem partido, que hoje conta com 100 projetos de lei tramitando no país. Em âmbito federal, dois projetos foram apresentados no início do ano: o PL 258, que é o substitutivo do projeto do deputado Flavinho (PSC/SP), e o PL 246, da deputada Bia Kicis(PSL/DF), que autoriza os alunos a gravarem as aulas e proíbe atividades político-partidárias de grêmios estudantis.
Para Russel, a educação tem um papel fundamental na construção de direitos e, para que não se percam estes direitos, “precisamos ter movimentos fortes na luta por acesso e representatividade nos espaços de poder", completou.
Enrico de Freitas, procurador regional dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal explicou como teve início a atuação do Fórum Permanente de Combate à Intolerância e ao Discurso de Ódio, do qual é coordenador, que reúne representações da sociedade civil, dos sindicatos e movimentos sociais.
Ele contextualizou a questão da liberdade de ensinar e aprender. Enfatizando que este tema não surgiu hoje, citou o exemplo histórico da bula papal de 1861, que já abordava a traz a questão do assedio em um dos seus itens.
Enrico também fez referência à Constituição de 1946 que, pela primeira vez, tratou da liberdade de ensinar e aprender, e à autonomia universitária, estabelecida em 1961, com a Lei de Diretrizes e Bases. Revogada durante a ditadura militar, só retornou no processo constituinte de 1988.
Na avaliação do procurador, mesmo que os projetos do Escola sem Partido sejam inconstitucionais, a intenção de seus autores é intimidar e impor a auto-censura nas escolas. Por isso, devem ser barrados. “A educação deve tornar as pessoas capazes de pensar numa sociedade plural e democrática, de promover a tolerância e em prol da paz.”
Enrico informou que o MPF instaurou inquérito sobre o decreto do governo que cortou verbas para universidades e institutos federais, e também sobre a extinção de cargos administrativos dentro das universidades.
Uma audiência pública deve ocorrer no próximo dia 7 de junho, envolvendo o MPF dos estados RS, SC e PR, para buscar uma explicação oficial do governo sobre esses temas. Outra iniciativa do MPF é a criação, nos próximos dias, de um canal de denúncias oficial sobre assédio e violação de direitos dos professores.
Confira aqui a cartilha sobre liberdade de cátedra, organizado pelo coletivo nacional dos servidores públicos e pela ADUFRGS.
Miriam Fabia Alves, professora da Universidade Federal de Goiás, manifestou preocupação com o movimento de militarização das escolas, "que tem ganhado força com o novo governo". Segundo ela, o tema está sendo discutido na Câmara dos Deputados, mas ainda sem muita clareza, embora já tenha sido criada uma subsecretaria no MEC para tratar desse assunto. Segundo ela, no estado de Goiás, trinta e uma escolas públicas já foram transformadas em escolas militarizadas, um movimento que está se expandindo para outros estados.
Para Miriam, a proposta dessas escolas tem relação direta com a liberdade de ensinar e aprender, pois os seus princípios são baseados em regras, hierarquia, obediência e submissão. “Por que precisamos de uma escola militarizada? Como se exercita a liberdade de ensinar e aprender num ambiente assim?”, questionou. Ela também refutou o argumento oficial da segurança e explicou que as escolas militarizadas se tornam seletistas, disfarçam as desigualdades e submetem os docentes a regras minuciosas.
O debate foi mediado pela professora Liliane Prestes Madruga , da ADUFRGS, que destacou a necessidade da sociedade questionar o discurso de ódio, de racismo e a falta de diálogo que tem tomado conta, principalmente, das redes sociais. “Precisamos ocupar esses espaços para ter os nossos direitos assegurados. Não estamos falando de LGBT e racismo como números, mas como pessoas, seres humanos, e é isso o que importa."